Um profeta? Mais que um profeta. Místico! Místico-profeta! Na convivência com dom Pedro fui percebendo nele um místico. O místico vê; vê mais e melhor do que nós, porque enraizado na terra da humanidade e em Deus. Tem inspirações que nos encantam, atraem; as palavras não são som nem letra, conduzem o espírito. Ele era aberto, livre, ousado, inspirado. Indicava sempre a vida do Reino porque para ele vivia, dele vivia. Profeta porque místico.

Ficávamos admirados e mesmo encantados no ressoar das palavras, pois entrevíamos o Reino da verdade e da graça, do amor, da justiça e da paz. Mas ele… via!

A vida simples e despojada, a oração, a profecia, a poesia, a amabilidade, a limpidez, a transparência, o pensamento; apontava caminhos. Esperançado: deixou de dialogar com alguém? As palavras eram geradas, nascidas de seus encontros com o Homem de Nazaré e de seu povo. Percorreu veredas, veredas do Evangelho, dos pobres! Para o místico-profeta a vida é morte; a morte é vida! Vida-morte: cheiro de ressurreição! Na passagem veio-me à memória:

“Y seremos nosotros, para siempre,
como eres Tú el que fuiste, en nuestra tierra,
hijo de la María y de la Muerte,
compañero de todos los caminos.
Seremos lo que somos, para siempre,
pero gloriosamente restaurados,
como son tuyas esas cinco llagas,
imprescriptiblemente gloriosas.
Como eres Tú que fuiste, humano, hermano,
exactamente igual al que moriste,
Jesús, el mismo y totalmente otro.
Así seremos para siempre, exactos,
lo que fuimos y somos y seremos,
¡otros del todo, pero tan nosotros!.
(Casaldáliga, P. Eu creio na ressurreição. Concilium, dez./2006)

Havíamos nos despedido com um longo aperto de mão e um olho no olho, sem palavras, no calor de irmãos. Agora és o que buscaste, viveste: convivência-amor do Reino definitivo. A esperança fez-se vida plena! E nós agora mais esperançados.

Gratidão por tudo: a Deus por tê-lo gerado e enviado e transformado. A ti por ter-te deixado transformar pelo amor extravagante da Cruz e dos crucificados. Gratidão pela vida de pobre e de sertanejo; gratidão por ter-te feito terra, no vale dos esquecidos; gratidão pela casa ser a casa de todos, um espaço familiar dos pobres; gratidão pela mesa de todos; gratidão pelo teu amor feito Igreja; gratidão pela martiria; gratidão pelo teu humor admirável, a alegria singela, o sorriso acolhedor; gratidão por regar esperança e plantas; gratidão pela santa teimosia nas palavras, nos abraços, nos afagos; gratidão pela capela enfeitada com as flores singelas do jardim e pelo acender a vela do altar; gratidão por estar antes de todos nós na capela para a oração da manhã e a eucaristia; gratidão pela comunhão com todo o Povo de Deus e com o sofrimento e dor dos pobres da terra e a dor da casa comum. A gratidão diante da gratuidade de tua vida que nos compromete, responsabiliza!

Ajuda-nos a percorrer o caminho de Jesus para sermos outros sem deixarmos pelo caminho os outros: os esquecidos e descartados.
Os místicos-profetas admiram e anunciam um novo céu e uma nova terra!

Manaus, 9 de agosto de 2010.
Leonardo Ulrich Steiner
Arcebispo de Manaus

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